quinta-feira, 30 de abril de 2009

Aos 30 surtei!

Foi assim que tudo terminou...Um belo dia, acordei ao lado do meu marido, dentro da minha bela casa, no meu quarto sob medida e vi que estava infeliz. Desci da minha cama imensa (porque meu marido reclamava que parecia dormir em cima de um muro, de tanto que ocupo espaço) coloquei meus pés no chão, por causa do ar condicionado, a sensação dos pés gélidos, me arrependi de não ter colocado uma meia pra dormir.

Me arrastei até o banheiro, me olhei no espelho e perguntei a mim mesma, quem era essa que eu estava vendo, de onde tinham vindo esses cabelos brancos, esses pequenos vincos ao redor dos olhos, os 10 kilos a mais que recheavam meu corpo inteiro, aquele sentimento de putz, que merda, como eu vim parar aqui tomou conta de mim.

Com meus 30 anos recém feitos eu me perguntava, onde estaá o sorriso mais lindo do mundo? O meu brilho dos olhos? A mágica que envolvia meus gestos? Não encontrei nada disso quando sentei no vaso para o meu xixi matinal e olhei para minhas mãos e percebi que minha unha vermelha estava descascada até a metade. Eu iria precisar de cinco minutos da minha preciosa manhã pra tirar aquela droga de esmalte das dez unhas..pra que dez unhas me perguntei...assim lá se foi o meu café da manhã.

Tomei meu banho ainda me olhando no espelho, aqueles que vendem dizendo que não embaçam no chuveiro, e porque diabos eu acreditei, não tenho a mínima idéia. Deslizei minhas mãos dos olhos aos cabelos tentando organizar meu dia. Saio do banho e como sempre não deixei nada arrumado para colocar hoje, minhas calcinhas estão molhadas e desesperadamente procuro na gaveta do meu marido uma cueca box que não aperte as minhas coxas.

Quando estou quase terminando minha rotina matinal, meu filho acorda e pede por mim, meu santo marido se levanta pra buscá-lo em seu quarto e ele grita como se nós fossemos todos surdos, EU QUERO A MINHA MÃE...é sempre assim, quando eu vou, ele pede o pai... e nós ficamos nos batendo pelos corredores tentando descobrir o que fazer pra não desencadear um terremoto as 8 horas da manhã.

Começa a minha primeira tarefa de gincana do dia, tentar colocar o uniforme da escola no meu filho de três anos, ele brincando se locomove em cima da minha cama imensa imitando o homem aranha, não pára quieto um segundo, quando estou quase enlouquecendo e perdendo a paciência, ele olha pra minha cara, como que adivinhando meus pensamentos e querendo piorá-los e dispara HOJE EU NÃO QUERO IR NA ESCOLA...

Minha vontade é sentar na cama e chorar, mas não posso, tenho um financiamento de 18 anos pra pagar da minha casa nova, escola, faculdade, carro, gasolina, seguro do carro, seguro da casa, seguro de vida, previdência privada, TV a cabo, luz, água, telefone, internet, faxineira e supermercado. Preciso me recompor e seguir o dia, prometo pra mim mesma que de hoje não passa, vou pensar em algo que eu possa fazer pra me sentir feliz, se não posso mudar de vida, preciso encontrar algo que me dê prazer.

Meu marido olha pra mim e faz a pergunta diária...eu levo ou tu leva? Eu quase pulo aos pés dele implorando ...tu leva... ele leva o nosso filho pra escola. Desço as escadas, abro a geladeira e penso que não vou tirar meu esmalte coisa nenhuma, eu quero tomar meu café da manhã. Pego o algodão e a acetona e jogo na bolsa, em alguma sinaleira no meu trajeto até o trabalho, eu faço isso.

Entro no meu carro novo, que ainda faltam 54 parcelas pra ser meu realmente, coloco o cinto e lembro que deveria ter posto minhas lentes de contato já que o meu óculos escuros com lente de aumento eu quebrei a mais de um mês. Porque além dos primeiros fios brancos, pés de galinha e peso além do justificável, eu não enxergo nada sem lentes de aumento. Penso pela trigésima vez que eu preciso ir ao shopping mandar fazer um novo, só que em 20 segundos me dou conta do porquê de ainda não ter ido...não tenho um centavo na conta, ou melhor, até tenho...só que tem um sinal de menos na frente.

Esqueço os óculos e entre um raio de sol que quase fura meu olho e o transito infernal que me acompanha diariamente da zona sul a zona norte, abro a acetona e pego o algodão, tento sintonizar em uma rádio que não me deixe mais atacada do que já estou, respiro fundo e penso, preciso me acalmar. Tento fazer um exercício de relaxamento que aprendi na casa espírita, quando estou quase conseguindo, um filho da puta buzina atras de mim e a acetona vira no meu colo, olho pro relógio, 8h45, começo a chorar.

Em frente a empresa em que trabalho, estaciono meu carro, abro a porta e fico olhando sem coragem de entrar, recolho minha bolsa, notebook e mais mil coisas que carrego pra cima e pra baixo e começo a dar os primeiros passos a mais um dia infinitamente igual. Passo pela entrada e dou um bom dia forçado meio sem olhar pra quem. Subo as escadas e sinto uma sensação de fraqueza, nada me irrita mais, cheguei no limite, no limite da minha paciência, não tenho mais força física para encarar nem mais um dia. No meio da escada penso em simular minha própria morte, finjo que escorreguei, bati a cabeça e preciso ser internada em um hospital ficando em coma durante um ano inteiro até encontrar um jeito de largar tudo e fugir do planeta terra.

Mas o último degrau chegou e me trouxe de volta a vida real e quando dou por mim, já estou no meu ciclo incessante de trabalho estafante. Abro meu computador e começo a ler meus emails. Passo o dia apagando incêndios, resolvendo o problema dos outros, educando os filhos dos outros. Ando tão cansada para educar o meu. Mal tenho tempo de praticar para chegar o dia de eu ter “os meus”. Me desloco de uma empresa a outra sem parar, quando não estou trabalhando, todo mundo me acha no celular, meu chefe me encontra quando do escritório já saí, meu marido me liga pra saber porque ainda não cheguei.

Por muito tempo achei que a minha relação com o aparelho celular era diabólica ou sobrenatural, a cada toque eu simplesmente estremeço. Não gosto de ouvi-lo tocar, sempre acho que é alguém me cobrando alguma coisa, um telefonema, uma visita, uma satisfação. O telefone da minha casa eu não atendo, eu não gostaria nem que ele existisse na verdade, só temos um número residencial, porque meu marido acha que toda a família normal precisa de um telefone convencional, pois em uma emergência a falta dele pode ser fatal...

17h30 começo a me despedir, até que todos esclareçam suas dúvidas, duas horas depois consigo girar a chave do carro e começo a pensar na volta pra casa. Respiro fundo, pego um chiclete, acendo um cigarro, coloco o cinto e ligo o rádio. A volta é sempre melhor, começo a desacelerar meu cérebro, meu corpo. Quero chegar calma em casa, quero abraçar meu filho e não passar toda a energia do meu dia pra ele, depois de muito engarrafamento que há essa hora já não me deixa tão louca, avisto de longe uma luzinha da portaria do meu condomínio, passo pelos portões da entrada e deixo pra trás tudo que me fez infeliz e idiota durante todo o dia.

Já chego dirigindo devagar e cumprimentado a vizinhança, dou uma espiada pra ver se alguém está com um copo de cerveja na mão, pois se alguém estiver, esse será meu destino, ao menos pela primeira meia hora depois de desligar o motor. Encontro os dois homens da minha vida me esperando, por vezes sorrindo, por vezes quase chorando, isso geralmente varia de acordo com a hora que chego. Nem sempre tenho energia para contar meu dia, para brincar com meu filho, para jantar com meu marido, mas até agora tenho conseguido disfarçar muito bem.